Agosto Dourado: leite materno se adapta às necessidades do bebê

O mês Agosto Dourado criado pela Aliança Mundial para Ação em Aleitamento Materno (WABA, na sigla em inglês), é celebrado anualmente com objetivo de ampliar a visibilidade e promover informação acerca da importância da amamentação para as crianças, mães e familiares próximos.

Considerada uma das prioridades pelo Ministério da Saúde, o incentivo à amamentação materna vem apresentando resultados em termos de estatística no país. Segundo uma avaliação dos índices do aleitamento materno dos últimos 34 anos, entre 1986 e 2020, houve um aumento de cerca de 1,2% ao ano na amamentação exclusiva de crianças de até seis meses de idade.

O alimento, considerado completo pelos especialistas e recomendado pela entidade, pode reduzir em até 13% a morte de crianças até os 5 anos de idade por causas preveníveis. A nutricionista do Sistema Hapvida, Fernanda Leister destaca que o leite materno é fundamental não apenas nos primeiros meses e anos de vida, mas ajuda na qualidade de vida na fase adulta. Também aponta a incrível capacidade de o leite materno se adaptar às necessidades específicas da criança amamentada, mostrando a conexão entre mãe e bebê.

Confira a entrevista:

Qual a importância de campanhas de conscientização sobre os benefícios da amamentação?

São muito importantes para as mães, companheiros e para quem auxilia no cuidado do bebê. As campanhas também esclarecem muitos tabus e dúvidas sobre esse assunto. Já sabemos que o aleitamento materno tem impactos não apenas quando se é bebê, mas também na infância e na fase adulta. Estamos falando de qualidade de vida também a longo prazo.

O leite materno deve ser a alimentação exclusiva do bebê até qual período?

O leite materno deve ser exclusivo pelo menos até os 6 meses de idade. A recomendação é de a amamentação ser ofertada pelo menos até os 2 anos. Dependendo da rotina da mãe do bebê, ela pode se estender até os 4 ou 5 anos.

Quais os principais benefícios nutricionais do leite materno?

Um dos principais benefícios é fortalecer o sistema imunológico do bebê, porque o leite materno é rico em anticorpos que são produzidos pela própria mãe. Então, acaba sendo uma defesa natural para o bebê. O leite sempre se adapta conforme a necessidade. Se o bebê ficar gripado, por exemplo, vai ter uma produção maior de determinados anticorpos. Se o neném tem uma pneumonia, alguma infecção intestinal, então sempre vai ter essa adaptação natural. O leite materno também ajuda na prevenção de obesidade e doenças crônicas no futuro da criança amamentada. Tem um efeito anti-inflamatório, então ele auxilia na prevenção da diabetes e problemas cardíacos ao longo da vida. Tudo isso em função de sua composição de gorduras e do seu equilíbrio nutricional, ainda auxilia no desenvolvimento do sistema nervoso, por conta de uma substância que se chama DHA. Presente no leite materno, essa substância participa da formação das células nervosas e facilita a comunicação entre elas. Esse processo é fundamental para a criança, pelo menos nos primeiros 5 anos de vida. Estamos falando da fase em que boa parte do cérebro está em desenvolvimento. A DHA vai ter um papel benéfico nessa formação do sistema nervoso. Ajuda também na prevenção de anemias porque o leite materno é rico em vitamina B12 e ácido fólico, importantes para a produção de células vermelhas, que são responsáveis pela oxigenação do sangue. Agora, a amamentação cria um vínculo entre mãe e bebê que acaba sendo importante nesse período de desenvolvimento. Traz amadurecimento para a mãe e para a criança.

Existe leite materno fraco ou insuficiente, ou isso é mito?

Não há leite fraco. O leite sempre vai se adaptar conforme a necessidade do bebê na fase de desenvolvimento. Então, numa certa idade, há uma composição, e depois essa composição vai mudando quanto aos itens presentes, como as gorduras, açúcar e anticorpos, entre outros. Por isso a livre demanda é essencial. A mãe deve deixar que o bebê apresente sinais de fome e, a partir disso, amamentar conforme a necessidade dele. É claro que muitas vezes a mãe está tendo dificuldade na oferta do leite. Isso causa uma menor demanda para o neném, que acaba sentindo mais fome e chega a perder peso. Nesse cenário, o acompanhamento médico e de uma fonoaudióloga ajuda. Eles orientam qual o melhor procedimento para que o bebê tenha a oferta adequada do leite materno, contribuindo para o ganho de peso. Geralmente, quando ofertado de maneira correta, o leite sempre vai garantir alimentação suficiente para o bebê nos 6 primeiros meses de vida. Em muitos casos, a mãe sofre muito nesse período com fortes dores e ressecamento da mama; por que isso ocorre? Dores e ressecamento ocorrem justamente porque a mãe não consegue ofertar o leite da maneira correta. Muitas vezes, corrigir a posição do bebê na amamentação e ampliar os cuidados com a mama são suficientes para resolver a questão. Por isso é muito importante a avaliação de um médico e de uma fonoaudióloga, que vão orientar sobre como evitar dores, o ressecamento da mama e a postura correta na hora de dar o peito. O acúmulo de leite, que chega a empedrar, também causa dores. Mas tudo ocorre justamente por conta de que tudo é novo: a mãe está conhecendo o nenê, o nenê está conhecendo a mãe.

A diminuição do leite materno pode estar ligada à alimentação?

A diminuição pode ter várias causas. Se falarmos da alimentação, pode ser que a mãe não esteja ingerindo nutrientes de forma adequada ou na quantidade necessária. Veja, a fase de amamentação não é o momento de restrições alimentares, de se fazer dietas. A mãe também deve ter uma boa ingestão de água. A redução da produção de leite pode estar relacionada à hidratação insuficiente. Amamentação é um momento de se respeitar a fome, de a mãe comer com qualidade e tomar muita água, porque isso tem a ligação direta com a produção do leite. Fatores emocionais também devem ser acompanhados, pois estão na lista de fatores que interferem na produção do leite materno. Também nesse caso, se necessário, a mulher deve buscar ajuda profissional.

Para situações em que a amamentação não é possível, pode ser recomendado o uso de fórmulas infantis?

Sim. Fórmulas infantis são recomendadas conforme a idade do neném. Há fórmulas bem balanceadas que se assemelham muito ao leite materno. Porém, os casos devem ser olhados individualmente e com acompanhamento médico. Primeiro, é necessário avaliar a alimentação e a parte psicológica da mãe. Devemos considerar inclusive uma eventual correção da “pega” do bebê, que é a forma como ele abocanha a mama. Se mesmo assim a amamentação não é possível, então a alternativa é usar fórmulas infantis que substituam o leite materno. É bom ressaltar que, nessas situações, não dá para fornecer outro tipo de leite. O consumo de leite de vaca, por exemplo, por bebês com menos de 6 meses de idade pode trazer complicações. O correto é não oferecer leite de vaca antes de 1 ano de vida.

Quais as principais diferenças entre leite materno, leite de vaca e fórmula infantil?

O leite de vaca tem muito mais proteína do que o materno. Isso pode sobrecarregar os rins do bebê, que ainda não estão suficientemente desenvolvidos para receber uma determinada quantidade de proteína. Essa sobrecarga prejudica o funcionamento renal. Outra diferença é a produção de anticorpos. No leite materno, a mãe já produz conforme a necessidade do bebê, o que não ocorre no de vaca. A mesma análise envolve as fórmulas. Houve avanço da tecnologia, mas o leite materno sempre vai se adaptar à necessidade de desenvolvimento do bebê. Se o neném está doentinho, o leite materno vai se adequar para combater aquele vírus ou aquela bactéria, o que a fórmula não consegue. Nada é tão completo e tão individualizado quanto o leite materno.

No uso de fórmulas, isso pode prejudicar a saúde do bebê?

Utilizar a fórmula no lugar do leite materno sem ter necessidade pode trazer prejuízos. O produto formulado atenderá o neném conforme a sua necessidade momentânea, mas a fórmula não consegue se adaptar. O leite materno sempre será superior à fórmula.